Wednesday, January 31, 2007

Saudade Eterna!

Ontem quando ia trabalhar pela Br, conversando com meus companheiros de trabalho no carro e vendo o verde da natureza, percebi que não estava presente naquela conversa, estava longe, há muitos anos atrás. Feliz com a visita do meu avô, correndo para seus braços e gritando:
- Voziiiiiinhoooooooo!
E logo me senti abraçada e aconchegada em seus braços confortantes e ouvindo sua voz serena e baixa devido a sua saúde:
- Lisinhaaaaaaaaa!

O tempo parecia não ter passado, cheguei a me esquecer que ele não está mais no mesmo plano que nós. Prendi-me nesta lembrança por alguns segundos e corri pro túnel do tempo, onde o encontrei me contando suas histórias de garoto, quando ainda era pobre, sempre muito sábio. Lembrei de suas comidas preferidas, da maneira que mastigava todas as balas, uma atrás da outra, não dando tempo para seu paladar perceber o sabor, a textura e o prazer de se chupar uma bala. E era uma atrás da outra! ele esvaziava seus bolsos e enchia suas mãos com o papel que as embrulhavam. Do carro que ganhou de aniversário, seu rosto expressando felicidade, principalmente quando nós – seus netos – entramos para dar uma voltinha com ele. De quando ele morava em Macaé, e eu em Rio das Ostras, e ia passar alguns finais de semana em sua casa e ele me levava para tomar milk shake, comer sanduíches e ainda ganhava banana split de sobremesa. Na volta, quando os sinais estavam fechados, ele gritava abre-te sesamo e como mágica a cor de vermelha passava para verde e nós ríamos satisfeitos passando pelas ruas coloridas e quentes. Era muito divertido!
Lembro-me da primeira vez que presenciei sua ausência de memória. Era meu aniversário e eu estava com a minha avó e minha mãe enrolando alguns docinhos, ele chegou, olhou para mim confuso, olhou pra minha avó e perguntou onde ele estava. Minha avó o sentou, explicou pra ele tudo e lhe ofereceu um lanche, e depois de comer, ele agiu como se nada tivesse acontecido e começou a conversar comigo sobre a minha festa.
Percebi há quanto tempo não tinha aquelas lembranças, há quanto tempo não sentia sua presença. Logo depois que ele morreu e até pouco tempo atrás, tinha sonhos com ele. E sua presença é sempre tão real que sua ausência é esquecida. Nesses sonhos, sempre muito coloridos, sinto seu cheiro, ouço sua voz, sinto seu carinho, ouço suas risadas e eles sempre terminam em um abraço aconchegante e apertado, que mata minha saudade do meu vozinho querido.
Até hoje não me conformo com a maneira de sua morte e me sinto culpada por ter tirado a minha tia de casa para me levar para fazer aquela prova (Fui fazer uma prova para um colégio no Rio de Janeiro onde queria estudar para o vestibular). Quando terminei uma moça que trabalhava no colégio veio me falar que meu pai tinha me ligado que era pra eu ligar pra ele. Já sabia que algo de ruim tinha acontecido, mas nunca podia imaginar que fosse algo tão sério com meu avô.

Sua última visita me marcou. Ele estava bastante debilitado e eu percebi que não tinha mais muito tempo de vida. Chamei minha mãe pra conversar e falei que tínhamos que nos preparar e principalmente preparar o meu pai – seu filho – para sua partida. Mas não esperava que fosse tão rápido e inesperado. No outro dia, fui à festa de fim de ano na casa de uma amiga, onde fizemos amigo oculto e levamos guloseimas. Meu avô foi me levar com seu motorista e eu prometi a ele um pedaço do bolo que eu estava levando. Na volta tirei um pedaço bem grande, embrulhei e contei a todos que ia levar pro meu avô, pois ele adorava doce. Chegando ao carro eu mostrei o bolo dele, ele abriu um sorriso gigante, com cara de criança sapeca e me pediu pra comer no carro mesmo. Eu sabendo que ele ia fazer uma lambança não consegui negar aquele prazer - de vê-lo saborear aquele pedação de bolo de chocolate. Ele abriu o embrulho, mordeu com uma satisfação e seus lábios ficaram cobertos com chocolate, ele me olhou com aqueles olhos enormes, com um sorriso de uma orelha a outra e disse que estava muito gostoso. E eu sorrindo olhando para ele, com os olhos lacrimejando, me senti a neta mais feliz do mundo. E ainda me sinto até hoje, pelos momentos fantásticos que passamos juntos.
Com os olhos cheios de lágrimas, voltei ao tempo, estava na Br, ainda contemplando a natureza e rezei pelo meu avô. Senti-me em paz e imensamente feliz.
Sei que onde quer que ele esteja ele está bem e muitas vezes que me sinto só e triste, rezo pedindo que ele me proteja e me guie e sinto sua presença, seu carinho e seu amor.
Desta forma, me despeço dizendo o que nunca me cansei de dizer para ele sempre que estávamos juntos - Vô, eu te amo!


Eclair Lengruber de Moraes sempre foi um homem esforçado e trabalhador, casou-se com Dona Eny Mangaravite de Moraes e teve seis lindos filhos – três mulheres e três homens. Homem trabalhador, mesmo tendo uma infância pobre e sem muitas perspectivas conseguiu passar pelos obstáculos da vida e conquistar tudo que se propôs quando jovem, inclusive comprar um avião. Sofria de uma doença ainda não identificada - uma variação do Mal de Alzaimer. Morreu ainda jovem de infecção hospitalar. Se acidentou em casa, no chuveiro, onde queimou mais de 50 % do corpo.